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Casa da Sabedoria

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Manuscrito da época do Califado Abássida.

A Casa da Sabedoria ou Casa do saber (em árabe: بيت الحكمة‎; romaniz.: Bayt al-Hikmah foi uma biblioteca e centro de traduções estabelecido à época do Califado Abássida, em Bagdá, no Iraque.[1] Foi uma instituição chave no "Movimento das traduções", tendo sido considerada o maior centro intelectual durante a Idade de Ouro do Islã.

A Casa da sabedoria foi fundada pelo califa Harune Arraxide, tendo atingido seu auge no reinado de seu filho Almamune (813-833). A Almamune, se credita o fato de ter atraído muitos eruditos conhecidos para compartir informação, ideias e cultura à Casa da sabedoria de Bagdá entre os séculos IX e XIII. Vários dos mestres muçulmanos mais eruditos fizeram parte deste importante centro educacional. Visavam a traduzir livros do persa para o árabe, além de preservar os livros existentes.[2]

Durante o reino de Almamune, foram estabelecidos observatórios, e a Casa tornou-se o centro de estudo indiscutido das humanidades e das ciências no Islão medieval, incluindo matemáticas, astronomia, medicina, alquimia e química, zoologia e geografia e cartografia. Baseados em textos persas, indianos e gregos, incluindo Pitágoras, Platão, Aristóteles, Hipócrates, Euclides, Plotino, Galeno, Sushruta, Charaka, Ariabata e Brahmagupta, os estudiosos acumularam uma grande coleção de saber mundial, e desenvolveram sobre essas bases as suas próprias descobertas. Bagdá era conhecida como a cidade mais rica do mundo e centro de desenvolvimento intelectual do momento, tendo uma população de mais de um milhão de habitantes e sendo a mais povoada da época.[3]

Fundação e origens

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Sob o Califado Abássida, muitos trabalhos gregos, chineses e de outras línguas como o sânscrito foram traduzidos para o árabe. Foram construídas grandes bibliotecas, e os intelectuais perseguidos pelos imperadores bizantinos foram acolhidos.[4] Também se traduziram trabalhos na Academia de Gundishapur, durante a Conquista muçulmana da Pérsia.

Em 750, a dinastia Abássida substituiu os Omíadas como governante do império islâmico e, em 762, o califa Almançor (que reinou durante 754-775) construiu Bagdá para ser a nova capital, que antes era Damasco. A dinastia abássida tinha fortes traços persas,[4] e adotaram muitas práticas do Império Sassânida - entre elas, o de traduzir trabalhos estrangeiros, exceto que agora os trabalhos eram traduzidos para o árabe. Para este fim, Almançor fundou um palácio-biblioteca, modelado segundo a Biblioteca Imperial Sassânida.

O conceito de "catálogo de biblioteca" foi introduzido na Casa da sabedoria e em outras bibliotecas islâmicas medievais, nas quais os livros se organizavam por gêneros e categorias específicas.[5] Nesta academia, tradutores, cientistas, escribas, autores, homens de letras e escritores costumavam reunir-se cada dia a fim de traduzir, ler, escrever, debater e dialogar. Muitos manuscritos e livros sobre vários assuntos científicos e em diversos idiomas foram traduzidos na Casa da sabedoria.

As atividades da biblioteca eram patrocinadas por uma grande quantidade de papelarias, que se duplicaram em livrarias, que chegaram a vender milhares de livros por dia. Esta indústria foi possível graças à abundância de papel (warraga).

Período de Almamune

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Sob a proteção do califa Almamune (reinou entre 813-833), a Casa da sabedoria assumiu novas funções relacionadas às matemáticas e à astrologia. O foco de interesse mudou dos textos persas para os gregos. Sábios notáveis pertencentes a esta época foram o poeta e astrólogo Sal ibne Harune, Alcuarismi (780–850), os irmãos Banu Muça, Sinde ibne Ali e Alquindi (801–873). O erudito cristão Hunaine ibne Ixaque (809–873) foi nomeado pelo califa como responsável pelos trabalhos de tradução. O tradutor mais renomeado foi o sabeu Tabite ibne Curra (826–901). As traduções realizadas durante este período foram superiores às anteriores.

A Casa da sabedoria floresceu com os sucessores de Almamune, Almotácime (reinou durante 833-842) e Aluatique (r. 842–847), mas declinou no reinado de Mutavaquil (r. 847–861) que, ao contrário dos seus predecessores, que seguiam a seita mutazilita, era seguidor do Islão ortodoxo e visava evitar a expansão da filosofia grega, uma das principais ferramentas da teologia mutazilita.

A Casa da sabedoria adquiriu reputação como centro de aprendizagem, se bem que as universidades -no sentido moderno- ainda não existiam, pela qual a transmissão do conhecimento se levava a cabo diretamente entre mestre e aluno. As Maktab[6] desenvolveram-se na cidade por volta do século IX, e no século XI, Nizã Almulque fundou a Nizamia de Bagdá.[7]

Os tradutores mais importantes desse período foram, de acordo com Delisle,[8] os seguintes:

Destruição pelos mongóis

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Assim como as restantes bibliotecas de Bagdá, a Casa da sabedoria foi destruída durante o cerco de Bagdá, em 1258, pelos mongóis. Perto de 400 000 manuscritos foram resgatados por Naceradim de Tus antes do cerco,[9] e levados para Maragha.

Outras casas da sabedoria

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Outros lugares também foram chamados de "Casa da Sabedoria":

Referências

  1. Iraq: The 'Abbaside Caliphate, Encyclopædia Britannica
  2. Josef W. Méri, Jere L. Bacharach, Medieval Islamic Civilization: An Encyclopedia, Ed. Routledge, 2006, ISBN 0-415-96690-6, p. 451.
  3. George Modelski, World Cities: –3000 to 2000, Washington DC: FAROS 2003. ISBN 0-9676230-1-4. Ver também Evolutionary World Politics Homepage.
  4. a b Wiet. Baghdad
  5. Micheau, Françoise. «The Scientific Institutions in the Medieval Near East». [S.l.: s.n.] pp. 988–991  Em falta ou vazio |título= (ajuda) em: Harv, Morelon, Rashed. 1996, pp. 985–1007.
  6. Escolas.
  7. Universidade.
  8. pág. 126 de DELISLE, Jean; WOODSWORTH, Judith. Os tradutores na história. Trad. de Sérgio Bath. São Paulo: Ática, 2003.
  9. George Saliba, 'Islamic science and the making of the European Renaissance', p.243